quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Atualizações.

Olá meus queridos leitores. Após uma grande pausa sem nenhuma nova postagem venho com dois contos. O Primeiro deles "A Semente do Mal" particpou do concurso de contos da comunidade Novos Escritores do Brasil. E o segundo entitulado "43 Graus", faz parte da antologias Rede de contos. Aproveitem a leitura.

A semente do Mal.


A história que contarei agora é de muito tempo atrás. Quando a maior fonte de renda do nosso país eram as plantações de café, excluindo apenas a extração de ouro. Em uma época em que fazendeiros eram os soberanos, com seus muitos e muitos hectares de café e sua mão de obra escrava.
A história que contarei é justamente de um desses fazendeiros, talvez o mais rico deles. Adamastor Saraceno era o seu nome, e todos que o conheceram dizem que ele dedicou todos os seus dias viventes para se tornar o maior produtor de café. Mas inconsciente, se tornou tambem o mais perverso dos homens que já caminharam sobre a face da terra.
A sua história antes de se tornar um homem de poder é desconhecida. Muitos acreditam que ele matou o próprio pai para herdar tudo o que o homem possuía, pois aos vinte e três anos de idade Adamastor já era proprietário de uma enorme quantidade de terras. E tambem virou dono de várias cabeças escravas.
Todos os seus empregados, excluindo apenas seu capitão do mato, eram negros. E todos sentiam um medo, ou melhor dizendo pavor de Adamastor. Mas o sentimento de medo não era nada comparado ao de ódio. Mas jamais existiu em todo o mundo o sentimento do ódio maior do que o do fazendeiro. As únicas pessoas que ele parecia não odiar eram sua esposa e as três filhas. Porem nunca foi dito que ele realmente as amava.
Mas vamos ao que realmente importa, contar sobre a tirania de Saraceno. Seus escravos só paravam de trabalhar quando desmaiavam, os mais velhos quando morriam de insolação. Quando algum deles tentava fugir era chicoteado pelo próprio fazendeiro, o qual se orgulhava de deixar as costelas dos homens amostra. E se algum escravo fosse pego roubando algo para comer,tinham a mão cortada fora e era prezo em uma jaula de ferro, seu corpo só era retirado de lá quando os pássaros haviam feito seu trabalho e deixado apenas os ossos. Muitas e muitas mulheres tiveram os bicos dos seios cortados, pois alegavam que Adamastor era pai do filho que traziam no ventre. Em todas as vezes as alegações eram verdadeiras.
A família de Saraceno testemunhava essas atrocidades sem poder lhe dizer uma palavra de reprovação. E nas ínfimas vezes em que houve uma tentativa, suas vozes foram caladas por tabefes. A vida seguia, o café regado a sangue crescia, os escravos diminuíam, mas eram substituídos.
A maldade de Saraceno teve seu auge no verão em que sua filha mais nova completou dezoito anos. Valentina sempre fora uma menina linda, de pele branca e cabelos negros. A única das filhas que herdara seus olhos verdes e expressivos. Durante toda a sua infância Valentina brincava com os filhos dos escravos, correndo pelos pés de café. E dividia uma amizade especial por Bomani, um garoto que era dois anos mais velho que ela. Os anos passaram e a amizade dos dois foi ficando maior, até o momento em que se tornou amor.
Valentina não tinha medo do pai como as outras irmãs e a mãe. E se encontrava com Bomani todas as noites desde que completara dezesseis anos, seus encontros permaneceriam secretos por muito tempo. Mas Valentina abandonara seus traços de menina e havia se tornado uma linda mulher. E essa beleza atraiu a atenção do capitão do mato de seu pai, que tentou de todas as maneiras conquistá-la, sem sucesso. Por um golpe do destino o capitão do mato descobriu os encontros dos dois jovens, e tomado de ciúmes e ódio ele os entregou a Adamastor.
A vergonha de ter sua filha desvirginada por um escravo, de ter sido engano por ela por dois anos encheu o coração de Saraceno de uma fúria incontrolável e cega. E foi essa fúria que fez com que ele atingisse o grau mais alto de sua maldade. Valentina foi espancada até entrar em estado de choque, seu rosto que outrora fora lindo estava deformado e contundido. Mesmo todo o apelo feito por sua mulher não foi suficiente para acalmar o fazendeiro que munido de uma velha espingarda disparou duas vezes no corpo da filha mais nova. Valentina morreu nos braços da mãe, delirando e balbuciando palavras sem sentido.
O pobre Bomani teve os braços amarrados a um tronco de madeira e as pernas amarradas a dois cavalos. Os animais foram chicoteados e só conseguiram se livrar dos açoites quando finalmente desmembraram os braços do rapaz e o arrastaram pelo chão por muitas e muitas milhas. Pouca coisa restou de Bomani quando os cavalos retornaram a fazenda.
Esse foi o ápice da crueldade de Adamastor Saraceno, assassinar brutalmente um casal de jovens apaixonados. Mas tambem foi sua ruína. Pois sua esposa jamais o perdoou pelo o que havia feito a Valentina, e dentro de si jurou vingança pela filha. A pior de todas elas. Muitos conheciam e temiam a magia negra que os escravos praticavam, a esposa de Saraceno era uma dessas pessoas. Mas seu medo acabou quando conheceu Kyesi, uma anciã que todos os escravos respeitavam muito. A velha Kyesi lhe ensinou muitas coisas, desde remédios e chás para dores e constipações, como tambem ensinou poções que eram capazes de feitos horríveis.
E foi com uma dessas poções que ela envenenou Saraceno. Antes de cair morto o homem tentou estrangular a esposa várias vezes, mas a poção era forte. Os lábios de Adamastor ficaram roxos, seus olhos negros como o carvão, a língua escancarou-se para fora da boca antes que ele morresse. Mas esse ainda não era seu fim, e se sua mulher soubesse disso teria disparado pelo menos três tiros em seu corpo antes de enterrá-lo.
Ele foi enterrado em uma cova funda, cavada pelos escravos. Seu corpo foi jogado na areia sem cuidado algum, sem caixão ou manto que o cobrisse. A tirania havia acabado, e ninguém saberia o que houve com Adamastor se os fatos que sucederam seu sepultamento não fossem tão bizarros, e tão irreais.
Nada cresceu no lugar onde o corpo fora soterrado. E a terra tomou um tom de ocre amarelado. Os pés de café que cresceram ao redor ficaram com as folhas e os frutos pretos, e a seiva que pingava era de um vermelho vivo. Mas o mais bizarro ainda estava por vir.
Unhas enormes começaram a brotar da sepultura de Adamastor. Grossas e retorcidas elas saiam de dentro da terra como as garras de um demônio que tentava fugir do inferno, em seguida longas mechas de cabelo grosso e esbranquiçado saiam aos tufos da cova. Por semanas os escravos olhavam horrorizados, as unhas crescerem mais e mais, e as tranças se misturarem com os ramos de café. Foi então que vieram os sons. Urros e berros que pareciam vir do próprio diabo, uivos guturais que não podiam ser feitos por uma garganta humana.
Você pode achar que essa é apenas uma das lendas do folclore do nosso país. Eu tambem achava até ver as garras retorcidas, os cabelos esbranquiçados e ouvir os gritos infernais que saiam da terra. Aquele lugar é esquecido por todos, abominado. Pois ali foi plantada a semente do mal, da discórdia e da perversidade. A única coisa que peço em minha orações é que o ceifador que ali está enterrado nunca se levante para colher a sua safra.

43 Graus.


Johnny voltava do colégio em silêncio. O sol irradiava um calor intenso e gotas de suor rolavam pelo rosto do rapaz. Seus pensamentos de dividiam em duas coisas: O sol e Amanda. Havia algo errado com o sol nesses três últimos dias e ninguém sabia o que era. A única coisa que sabiam é que a cada dia ficava mais quente. O dia anterior tinha sido quente, mas no dia seguinte ele perderia seu pódio com certeza. Podia até ver nos jornais do dia seguinte o título em letras garrafais: ESTUDOS REVELAM NOVO DIA MAIS QUENTE DO ANO. A data seria vinte e três de Março, o dia quente que estava vivendo no momento.
E Amanda. Uma garota linda da turma dos nerds por que estava apaixonado e descobrira que ela tambem sentia o mesmo. No bolso de trás de sua calça havia um pedaço de papel com o telefone dela. Por que diabos tinham que ser diferentes? Por que o capitão do time de futebol do colégio não poderia namorar uma nerd? Mas por que se importava com isso? Era a pergunta que se fazia. A única coisa que importava naquele colégio era a reputação de cada um. A dele era uma das mais invejadas, mas poderia perder toda ela por causa de Amanda? O que escolheria?
As gotas de suor agora formavam enormes poças sob seus olhos. Com um dos dedos se livrou delas e continuou andando. Em um dos muitos quintais um casal de crianças brincava com uma mangueira molhando um ao outro.
Chegou em casa e foi direto à geladeira. Abriu uma garrafa de refrigerante e encheu um grande copo para si. Tomou tudo em um único gole, mesmo com o calor que estava sentiu-se melhor. Como de costume não havia ninguém em casa, seria mais uma das tardes solitárias que Johnny enfrentava todo dia. E foi esse pensamento que fez ele subir as escadas correndo em direção ao quarto. E sentar-se em sua cama ao lado do telefone.
Retirou o telefone do gancho e o levou a orelha. Olhava do pedaço de papel para o teclado do telefone. Apertou os primeiros números e o dedo indicador travou no ar, quando finalmente o dedo se moveu a linha caiu. Retornou a digitar alguns números, mas o dedo travou novamente. As mãos começaram a tremer fazendo com que ele desistisse e colocasse o telefone de volta ao gancho. Deitou se na cama e ficou fitando o pequeno pedaço rasgado de uma folha de caderno e a caligrafia escrita em tinta rosa. Como que hipnotizado adormeceu. E sonhou.
Em seu sonho as ruas tinham um tom alaranjado. Fechou as mãos em concha e as levou aos olhos, mesmo ao enorme calor sentiu um arrepio gelado descer a espinha ao contemplar o sol. O sol era agora uma enorme bola laranja, algo incandescente se desprendia como tentáculos e se desfaziam no ar. A bola de fogo parecia crescer cada vez mais no céu e suor escorria de seu rosto até cair pela ponta do queixo.
Começou a subir uma rua, algo lhe dizia que restava pouco tempo. Os gramados na frente de todas as casas tinham uma cor amarelada e pareciam terrivelmente secos. Tão secos que se quebrariam com um único toque ou assopro que recebessem. As folhas de todas as árvores exibiam a mesma coloração. Era como se toda a cor verde fosse diluída em sépia.
Alguns passos à sua frente viu a manchete de um tablóide: O APOCALIPSE CHEGOU. A data era vinte e cinco de março. Largou o jornal e continuou subindo a rua. Continuou subindo a rua, na sua cabeça um som de correntes sendo balançadas o guiava rua acima. Passou por um grupo de pessoas, homens trajando paletós e mulheres em vestidos cantavam e balançavam bíblias no ar.
O som das correntes ficava mais próximo a cada passo. Passou por um homem sentado a beira da calçada. Seus olhos pareciam cansados e não conseguia manter-se ereto. Johnny sentiu um forte odor de álcool quando o homem falou.
– É o fim... Não adianta cantar ou se arrepender agora... Em breve todos virarão cinzas. Falta pouco agora... Muito pouco...
Chegou a um parque e o som das correntes cessou. O som deveria ser de um balanço onde havia uma garota sentada. Caminhou em direção a ela e a reconheceu. Seus cabelos negros caídos sobre os ombros. Através dos óculos os olhos verdes e lacrimejantes dela fitavam o tronco de uma árvore próxima. Ele seguiu o olhar e viu um coração desenhado na madeira, dentro dele algum casal havia escrito as suas iniciais. Por um segundo imaginou se Amanda não via no coração as iniciais “J+A”. Voltou-se para ela e viu, horrorizado que a pele do rosto dela começara a borbulhar.
Os longos cabelos começaram a encurtar e tomar um tom castanho até entrarem em combustão e se inflamarem. A pele do rosto borbulhava loucamente e se desprendia em fagulhas caindo ao chão, suas mãos foram envoltas em chamas que derreteram suas unhas. A árvore fez um estalo alto jogando no ar várias lascas de madeira em chamas. A copa da árvore já era uma tocha feita de folhas que crepitavam. Amanda soltou um grito estridente que aos poucos começou a parecer um gargarejo. O interior de sua garganta tambem estava derretendo, os lábios dela caíram ao chão como plástico derretido. O corpo dela pendeu para frente e foi abraçado pela chamas que subiam do gramado infernal. O pequeno balanço começou a entortar sob as barras de aço e caiu ao chão. A árvore agora não passava de um pequeno toco e do chão levantavam-se cinzas que tomaram conta do ar.
Johnny olhou para o céu e viu aquela bola incandescente fervendo, ouvia o chiado do asfalto queimando. Abriu a mão e viu um pedaço de papel com letra rosa começar a queimar.
Acordou assustado em sua cama em uma poça de suor. Olhou para a janela e o sol ainda brilhava forte no céu. O relógio anunciava 17h30min. Passou as mãos no rosto tentando se livrar do suor que escorria e sentiu algo em sua mão esquerda. Era o pedaço de papel escrito com tinta rosa, tinha as pontas chamuscadas, mas ainda era possível ler os números escritos.
Deu um salto da cama em direção ao telefone, pegou o aparelho e digitou o número. Aquilo que acabara de vivenciar não era um mero sonho. Não quando o sol ainda brilhava fortemente às 17h32min e no dia anterior nesse mesmo horário ele já desaparecia no horizonte. Do outro lado da linha uma voz feminina atendeu. Uma voz conhecida.
– Amanda? Sim é Johnny... Estou bem, só liguei para... – Respirou fundo e terminou a frase de uma vez – Para saber se você não quer passar o dia de amanhã junto comigo?

domingo, 28 de março de 2010

Nada além do negro.


Você tenta fugir da dor e da tristeza. Mas aquelas mãos, com seus dedos longos e magros como garras te puxam para o negro.

Nada além do negro.

E você acaba caindo em um lago de águas escuras. E vai afundando cada vez mais na escuridão e no frio. Tenta encontrar o caminho de volta, mas não consegue enxergar nada...

Nada além do negro.

E você continua caminhando por ruas sem nomes, vendo rostos sem faces. Apenas borrões onde deveriam estar às expressões de felicidade, de pesar, de dor. De qualquer sentimento que o valha. Então você tenta procurar em seus corações, mas lá não há nada...

Nada além do negro.

E assim nós caminhamos. Tentando ouvir a melodia tocada por cada gota de chuva. Cada nota que caí do céu. Ouvindo cada história que é contada quando uma folha seca se desgruda de seu galho. Mas o som que mais se propaga no silêncio é o estilhaçar das promessas quebradas e dos corações partidos. Os sons que precedem o silêncio sinistro do negro.

Nada além do negro.

Ninguém sabe ao certo de onde vem o negro. Ou o porquê dele vir. Mas quando ele aparece, a luz se esconde. Os sons desaparecem. E assim ficamos surdos e mudos. Nada se houve nada se fala...

Nada além do negro.

Filho Pródigo.



Eu olho para o horizonte e não sei dizer se estou indo ou vindo. Se o que vejo é o passado ou o futuro que se aproxima.
As vezes que matei. Que morri. Não me dizem nada, não consigo distinguir a lágrima da dor da lágrima da alegria.
Foi se o tempo em que as respostas eram sopradas pelo vento. Hoje vejo as pessoas matando e morrendo, sem saber os motivos.
Aquele abraço acarinhado eu não tenho mais. Não recebo mais o amor de outrora. Foi-se o sentimento de alegria do olhar que tantas vezes eu procurava... Que hoje acho que nunca encontrei.
Andamos sob o mesmo sol, a mesma lua. Mas nos achamos dignos de acabar com o outro. Não somos mais iguais?
O que acabou com os meus sonhos?
Com as minhas realizações?
O medo de seguir adiante? Ou o destino que não foi traçado como deveria? Não sei...
A única coisa que é certa é que não escaparei das mãos do destino que me levarão à morte... Um dia.
Morte... Uma palavra tão pequena para algo que é tão imenso... O que nos espera além do toque frio do ceifador? Do sorriso congelado no rosto cadavérico da morte?
Divagações novamente. É a única coisa que minha mente cansada consegue fazer. Pensar no que eu vi; no que senti; no que ainda vai acontecer...
As melodias que compus hoje me soam tão distantes. Cada nota tocada me contava uma história de um mundo em que eu sabia se estava caminhando para frente ou para trás. Um mundo que hoje não existe mais... E eu nem sequer sei a causa de seu fim.
Aqueles esqueletos escondidos nos armários querem mesmo dizer um segredo? O que eu escondo de mim mesmo?
Apenas divagações... Apenas grãos pequenos de areia que se perdem em uma imensa praia de pensamentos. Noções vagas do ser que eu fui, que eu ainda me transformarei através de uma metamorfose sinistra que sugara as minhas forças e me deixará velho... Novamente.
Uma criança corre, sem medo, sua coragem é reconfortante. O que ela espera? O que ela sente correndo assim tão livremente? Tão segura de si... Desistirá ela quando tropeçar na primeira pedra no caminho?
Os amores que eu vivi...
Os que nunca aceitei...
Os que me fizeram bem... Mal...
Onde andam eles? Perdidos? A salvo em uma redoma de vidro? Protegidos pelo tempo que corrói e que amarga a doçura dos dias de ouro?
Ouro... Será que algo que reluz tanto é realmente tão precioso? Conseguirei comprar toda alegria, amor, felicidade ou qualquer outro sentimento bom com algumas pepitas de ouro? Não... Essas coisas estão perdidas há anos. Tão perdidas quanto à luz das estrelas que ainda chegam a nós, mas que suas verdadeiras donas já se extinguiram há séculos.
Séculos... Todos os que se passaram. Todos aqueles que ainda passarão... Me fazem pensar... Quantos mais viverei? Quantos outros irei morrer novamente?
Viver... Uma palavra tão bonita para algo tão complexo. O que é o viver? Se a única certeza da vida como já disse... São as terríveis e gélidas mãos do destino. As mesmas que te tiraram todos aqueles que você ama, que você se preocupa...
Não, não importa o quão forte você está. A vida, nada mais bate tão forte quanto a vida. Você tem que apanhar, e aprender suportar toda a dor que a vida lhe dá...
Pois dos momentos de dor, é que tiramos as forças para procurar os momentos de alegria. São esses momentos terríveis que nos fazem procurar a felicidade como um esfomeado...
As horas passam, mas com a chegada da aurora elas parecem voltar. Junto com o tempo que se passa ao contrário minhas rugas começam a sumir. Minha juventude vai voltando e eu sinto a força em meu corpo.
A vida assim segue, com os seus altos e baixos.
Continuo dançando no telhado, seguindo o ritmo da música que nunca consegui ouvir. Mas mantendo sempre o compasso para não despencar...
A única coisa certa... As mãos... E todas aquelas escolhas que eu fiz. Delas... Talvez me arrependa apenas das quais eu disse não.
Talvez...

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Nosso pequeno pedacinho do inferno.


Nunca soube o verdadeiro nome daquela cidade, nem em meus piores pesadelos com aquele estranho e literalmente infernal lugar. Hoje o chamo de pequeno pedaço de inferno, e sei que sua história é muito pior do que a maioria acredita. O pequeno pedaço de inferno era uma cidade, ou melhor, uma pequena comunidade religiosa. Seus habitantes dedicavam suas preces e sacrifícios a um anjo de muitos nomes. Às vezes nomes belos e cheios de luz, em outras, nomes que faziam os pêlos da nuca do mais valente de todos os homens se arrepiarem para sempre. Pouco a pouco as coisas na pequena comunidade começaram a ficar estranhas, todos os pássaros assim como cavalos, porcos e vacas morreram. Enormes bolhas de sangue cresceram em seus corpos, por dentro e por fora. Todos os poços tiveram sua água transformada em sangue. Enxames de moscas invadiam as casas, ruas, todos os lugares. Uma névoa roxa cobriu a luz do sol fazendo com que plantas e árvores morressem lentamente. O pavor começou a tomar conta dos moradores, mas o pior dos pesadelos ainda estaria por vir. Uma enorme muralha feita de espinhos e rosas negras cresceu em volta do lugar, era tão densa e seus espinhos tão afiados que era impossível escapar de lá. Todas as crianças desapareceram uma noite, ninguém soube até hoje o que houve com elas. Mesmo com todo o horror que acontecia os moradores continuavam com suas preces e sacrifícios, até o fatídico dia em que um enorme trono feito de mármore vermelho apareceu bem no meio da pequena cidade. O chão se abriu em frente ao trono e de lá brotaram chamas de cor negra, do meio das labaredas o anjo adorado subiu e sentou-se em seu local. A vida abandonou aquele lugar, aqueles que passam perto de nosso pequeno pedacinho do inferno na terra podem ouvir o som dos corpos que ainda queimam naquele lugar. E tambem as gargalhadas do anjo sentado em seu trono.

sábado, 11 de abril de 2009

Homo Sapiens Transistorz.

Olá amigos Segue aqui mais uma louca história que nunca deveria ter saído de minha cabeça.



Diário de Alexandre Álvares 22.03.2048

“Hoje quando voltava do trabalho testemunhei a coisa mais estranha que já havia visto em minha vida. E tenho certeza de que todos que estavam ao meu redor tambem o acharam. Como de costume saí do escritório as 17h05min, mesmo sendo tão tarde o sol ainda não havia se escondido totalmente. Havia deixado o carro no estacionamento que ficava na rua abaixo ao edifício em que trabalho, não por que fosse mais barato ou coisa parecida. Mas por que assim eu poderia tomar toda tarde aquele pouco de sol e respirar algo que não fosse proveniente de um ar condicionado. Foi quando aguardava junto com outros transeuntes o semáforo nos liberar caminho, que aconteceu o tal evento. O sinal havia ficado amarelo para os veículos e a maioria dos motoristas tiravam o pé do acelerador, um daqueles automotivos japoneses cinzas vinha vagarosamente quando algo caiu do céu e chocou-se contra o seu pára-brisa. A coisa fez um baque surdo porem alto, e estilhaçou todo o vidro. O motorista freou o carro no mesmo instante e saltou para fora. Não demorou para que as pessoas se juntassem a ele no intuito de ver o que havia caído, de início não tive interesse algum em saber de que se tratava. Mas ao ouvir o som de surpresa dos que se aproximavam, resolvi dar uma espiada. Devo admitir que não reconheci o “objeto” quando pus os olhos nele, a coisa pareceu-me um tijolo com penas devido ao seu formato. Mas após ter apurado a visão percebi que era um pombo, é claro que aquilo não podia ser um pombo comum. Era imenso e com toda certeza pesado, pois havia quebrado o pára-brisa do veículo. Mas a coisa mais estranha no “animal” eram os fios que saltavam de suas órbitas e bico. Um enorme emaranhado cor de cobre fora vomitado pelo bicho, e expelido para fora de seus olhos. A língua pendia para fora do bico e pingava algo preto. Aquilo parecia um robô que havia explodido de dentro para fora, mas era um pombo. Embora me recuso a acreditar que seja um, mas que explicação poderia ter aquilo? Um brinquedo com toda certeza não era, algo tão pesado podia machucar uma criança. E tambem não acredito que fosse uma câmera secreta da CIA, KGB ou qualquer outra sigla. A menos que essas entidades estejam construindo ciborgues e tiveram a brilhante idéia de começar justamente pelos animais. Lembro-me que as pessoas se entreolhavam, e discutiam sobre o que diabo era aquilo. Eu realmente não sei, mas sei que robôs não tentam respirar. E sei tambem que brinquedos não defecam, pois o nosso amigo emplumado fazia os dois.”

Diário de Alexandre Álvares 25.03.2048

“Se o evento do pombo foi estranho, hoje nos jornais li algo que me pareceu mais estranho ainda. Não me lembro exatamente o nome da cidade em que ocorreu o fato, e isso tambem não importa. O importante é que se eu houvesse lido ao maldito jornal antes de ter conhecido o tijolo com penas, eu jamais iria acreditar na matéria. Uma dona de casa havia encontrado seu gato morto atrás da porta da garagem de onde morava, sei que não parece grande coisa. E não seria se a porra do gato não tivesse vomitado óleo, e se em seu interior não fossem encontrados fios de cobre revestidos de plástico que ligavam o cérebro ao coração e outros órgãos. Segundo a noticia nenhum vestígio de sangue foi encontrado dentro do animal, o veterinário responsável pelos estudos chegou a afirmar que o sangue do bichano havia sido trocado por óleo, ou se “transformado” nele. Realmente fiquei assustado quando li a parte do sangue sendo transformado em óleo, como algo assim poderia acontecer?
Se o caso do gato parasse nesse exato momento, ficaria mais tranqüilo. Mas o gato havia mais para mostrar. Uma de suas patas traseiras, à esquerda se não me falha a memória... Bom não interessa qual das patas. Dessa vez foi o cálcio que se transformou em cromo, os ligamentos haviam virado pistões. “Isso foi o que mais me espantou, era uma prótese perfeita de aço, ou qualquer metal. Ainda estava ligada ao osso no momento em que examinei o animal, e não foi apenas isso. Mesmo após a morte, o “cromo” ainda nos ossos penetrava nos ossos do animal. O aço subia para os ossos, com uma cor de ferrugem que aos poucos se transformava em prateado...” Eu parei de ler nesse exato momento, meu coração já parecia subir pela garganta então me certifiquei de que ele não faria isso fechando o jornal.”

Diário de Alexandre Álvares 26.03.2048

“Minha cabeça virou uma bagunça total hoje, já havia ficado realmente assustado com os dois casos que havia se passado. Mas nada no mundo me prepararia para o que aconteceu hoje, estava em meu escritório terminando mais um dos relatórios infernais que estavam sobre minha mesa. Quando ouvi um som estranho, e algo passou por detrás de minha cabeça em alta velocidade. Tentei seguir o som, mas só conseguia ver um reflexo prateado cortando o ar a minha frente. O som lembrava o de uma sacola dançando ao vento, mas com uma grande intensidade. O reflexo prateado ficou parado no ar contra a luz, e começou a descer lentamente em minha direção até pousar em meu braço. Fiquei maravilhado ao ver que era um inseto, não sei dizer que inseto ele era anteriormente. Mas acredito que fosse uma libélula, devido aos seus movimentos rápidos. O bicho era todo de metal reluzente, seus olhos viraram duas lanternas vermelhas que giravam nas órbitas e pareciam observar milimetricamente todos os lados. As pontas de suas patas lembraram-me alfinetes, mas o que realmente me deixou estarrecido e maravilhado foram suas asas. Elas eram um trançado de fios dourados, recobertos por vidro. Quatro pares de asas que reluziam contra a luz, três pares de pernas que caminhavam sobre a manga de meu paletó. Nas laterais do corpo de meu novo amiguinho pude ver duas longas linhas que pulsavam bombeavam um líquido negro, o bicho caminhou até a as costas de minha mão e ficou parado ali. Seus olhos se voltaram para a minha pele, pude sentir o local onde os fachos de luz vermelha fitaram esquentar, levantei a mão até a altura do rosto para observar a coisinha. Uma longa estrutura espiralada como um saca rolhas saiu do abdômen da libélula, e desceu com força nas costas da minha mão. A dor foi extremamente profunda, e instintivamente levei a outra mão ao lugar e espalmei o bicho. Ela não devia ter mais que quinze centímetros, pois a palma de minha mão a cobriu inteira. O inseto estava em uma poça do liquido negro, Uma de suas patas se contorcia em espasmos frenéticos. Faíscas azuis saltavam de seu corpo, e arrepiaram os pêlos de meu braço. Fiquei desanimado ao ver o que tinha feito, não dei um funeral digno para a libélula. Apenas a joguei no cesto de lixo abarrotado de papéis e fui ao banheiro lavar a mão suja do líquido negro. Fiquei com o inseto e todos os outros bichos em minha cabeça o dia inteiro, eles tomaram conta de meu pensamento e não me deixaram em paz. Continuo não sabendo o que está acontecendo, e duvido que alguém saiba. Mas essa coisa já obteve sucesso ao dominar os insetos, pelo menos no caso da libélula a metamorfose havia sido perfeita chegando além disso. Pois a libélula ganhou um par extra de asas e o ferrão em forma de saca rolhas , sem contar tambem aqueles olhos vermelhos. A pergunta que me faço é: Até que onde essa “evolução” alcançará? Em qual grau da cadeia alimentar ela irá parar?”

Diário de Alexandre Álvares 02.04.2048

“Vários animais e insetos foram encontrados robotizados, até o momento nenhuma pessoa apresentou alguma alteração em seu organismo. Teria a evolução parado? Sei que esse diário era usado para descrever coisas do meu dia-a-dia, mas agora ele será uma espécie de reportagem sobre esse evento que por enquanto não se mostrou mais presente. E espero de coração que esse diário volte a ser o que era...”

Diário de Alexandre Álvares 06.04.2048

“Li uma matéria no jornal hoje que me chamou muito a atenção, mesmo com tantas evidências desse estranho fenômeno muitas pessoas se recusam a acreditar nele. Vários são os relatos de que isso não passa de um teste do governo para verificar qual o comportamento da população em meio a um fato inexplicável. O número de animais “evoluídos” diminuiu razoavelmente. Não acredito que a “evolução” tenha parado e sim que ela está se adaptando. Se tornando mais lenta para não afetar os indivíduos os quais ela “domina”.”

Diário de Alexandre Álvares 13.04.2048

“As minhas suspeitas começaram a ficar conclusivas, pelo menos em parte. A evolução não parou e tenho a prova disso em algum lugar de meu organismo. Se desenvolvendo e crescendo a cada segundo que se passa. Hoje no horário de meu almoço fui que pude comprovar isso. Como em toda semana de pagamento levo algumas contas para o escritório e as pago nesse horário. Foi quando cheguei à porta giratória que fui pego de surpresa pela “evolução”. Como de costume tirei as chaves, moedas e celular dos bolsos. Os depositei naquela caixinha que fica ao lado da porta, e quando tentei atravessá-la fiquei preso. Um dos seguranças se aproximou, dizendo que deveria retirar todos os objetos de metal dos bolsos. Não havia mais nada em meus bolsos que fosse de metal, voltei alguns passos atrás e tentei entrar novamente. A porta mais uma vez me negou acesso ao banco, senti uma ponta de raiva crescer dentro de mim, seguida de medo. Retirei meus pertences da caixinha e dei a vez para o próximo tentar entrar. O homem que estava atrás de mim retirou seus pertences dos bolsos e os depositou no mesmo lugar que eu havia deixado os meus. Observei-o tentando entrar no banco, a porta travando novamente. Não precisei ficar para ver que muitos outros não conseguiriam entrar naquele local, algo em nossos organismos estava ativando o detector de metais daquela porta.”

Diário de Alexandre Álvares 15.04.2048

“Descobri hoje uma transformação em meu corpo. E devo dizer que estou realmente abalado, um dos ossos de meu cotovelo se transformou em aço. Posso sentir seu formato “mutante” sobre minha pele. E sentir tambem o frio proveniente dele, é como ter um cubo de gelo sobre a pele. E essa sensação de gelado está tomando conta de meu braço, vagarosamente, mas é possível sentir ele pulsando sob a minha pele. Cada osso formiga freneticamente, em minha imaginação consigo vê-los se transformando no cromo prateado, ficando primeiro laranja enferrujado e depois prata. O cálcio sendo transformado em chumbo, ou qualquer outro metal ou aço. Outra coisa que já perceptível é o meu sangue, minhas veias agora estão saltadas. Como se o líquido que sempre as preencheu tivesse aumentado de tamanho, se expandido, ficado mais grosso... E talvez negro. Abalado não é bem a palavra que devo usar, estou amedrontado, em pânico. Será mesmo esse o nosso futuro? Evoluirmos até nos transformamos em máquinas, sem sentimento, sem alma? O orgânico sendo substituído pelo industrial? A “mágica” da vida sendo transformada em tecnologia? Depois de tantos acontecimentos e fatos, me parece impossível pensar ao contrário... Em breve mudaremos nosso jeito de ser, nosso modo de viver? Seremos humanos dentro de uma carcaça de metal? Ou nossa mente prevalecerá e não seremos transformados “totalmente” em máquinas? Isso pode ser um novo começo, ou o fim de tudo... Como criaremos um novo ser? Não seremos mais pais e mães? Os livros de ciência terão que ser atualizados, pois o Homo Sapiens se transformará em Homo Transistorz, seremos o topo da cadeia alimentar, pois não nos alimentaremos mais de nada... Eu viverei para responder todas essas perguntas, disso tenho certeza. Mas antes que as respostas se concretizem voltarei a tomar a aqueles banhos de sol, sentir a água do mar em minha pele. E todas aquelas sensações que só nos “humanos” podemos sentir, antes que minha carne caia de meu corpo, que meus ossos virem cromo e meu sangue se transforme em óleo. Antes que meu ser vire uma carcaça de aço...”